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MMC MAGAZINE / MÚSICA: A força da voz LGBTQIA+


As artes sempre foram palco de opiniões fortes e também de luta e resistência. Atores e cantores conseguiram através de suas atuações e músicas apontar os holofotes para temáticas sociais importantes, e acharam na cultura uma melhor aceitação de suas ideias e ideais. Na última década, artistas do meio LGBTQIAP+ viram, em suas músicas, interpretações e vídeos, uma chance de se expressar sem censuras e poder falar sobre liberdade e opressão, alegrias e tristezas, amor e badalar, além de levantar outras bandeiras importantes e se colocarem sempre frente a muitas causas em nome da comunidade e liderando novas batalhas por direitos em meios as suas melodias.

Com um trabalho consistente desde 2019, o cantor Piettro vem fazendo um “barulho bom” com suas músicas e vídeos que falam de amor, sexo, dança e sensualidade. Com 13 obras lançadas, de forma independente, o brasiliense já soma mais de 7 milhões de views no Youtube e mais de 38 mil inscritos.

O cantor possui parcerias com artistas brasileiros que são sucesso em diferentes partes do mundo como Oxa e Fontana, com quem teve seus últimos dois trabalhos lançados: ‘Sientate’ e ‘Beleza’ respectivamente. Os feats trouxeram admiradores da Alemanha, Suécia, Turquia, Grécia, México e Estados Unidos. Além de músicas e clipes muito bem produzidos, Piettro busca sempre dar o seu toque pessoal às produções e sempre toca em assuntos que fazem parte da sua rotina e também da comunidade LGBTQIAP+, que é uma das suas bases.

- O mês de junho é algo que me representa, me faz sentir pertencente à uma coisa maior. O público LGBTQIAP+ é minha base e significa muito para mim. No início da minha carreira, antes de assumir a identidade Piettro, me apresentei em várias Paradas do Orgulho e elas foram um marco na minha carreira, desde o início meus melhores shows foram nelas. Espero poder fazer novas apresentações, agora como Piettro para esse público que merece o melhor de nós artistas – completa.

Outro nome bastante conhecido por sua luta a favor dos direitos LGBTQIAP+ é o ator Hugo Bonemer. Em 2019, quando decidiu falar abertamente que é gay, ele não tinha ideia de como fez com que muitos vissem nele uma figura de apoio e de encorajamento frente a sociedade, familiares e amigos.

- Na época eu estava em cartaz com dois musicais que fazem parte da minha vida, “Yank” onde eu fazia Stu, um correspondente que se apaixona por um soldado em plena 2ª Guerra Mundial e “Ayrton Senna – O Musical”, onde fazia o papel título. Ao contar da jornada dupla a um repórter ele perguntou sobre vida particular e “se eu tava namorando?”… eu disse “sim’, ele perguntou “quem era ela?” eu disse “é ele, ”. Deveria ser sempre simples assim, né? – recorda Bonemer.

O ator tem usado, desde então, seu espaço em entrevistas, mídias sociais, além de convites para congressos e palestras, para falar sobre. Na TV, em 2019, quando participou do quadro Show dos Famosos, do Domingão do Faustão, Hugo também foi dono de alguns momentos marcantes para os fãs de música Pop e da comunidade LGBTQIA+.

- Na época eu estudei quem homenagearia no quadro junto com a equipe, eles me deram opções e eu tive também chance de dar meus pitacos. Vieram Lulu Santos, que sempre semeia o amor, Amy Winehouse, um ícone, Freddie Mercury, cujo talento atravessava a lgbtfobia, mesmo não levantando bandeiras, criou hinos que deram voz a centenas de milhares de pessoas que sofriam caladas. Apesar de tudo, os fãs sempre curtem lembrar de quando fiz Britney Spears, alguns me disseram que eu fiz o que eles queriam fazer sempre, uma diva pop em pleno domingo em horário nobre. Fico muito feliz em poder levar essa alegria e ajudar quem passa pela batalha da auto aceitação– completa Hugo.


Com apenas 34 anos, RAZA é outro cantor que se lança de forma independe e sem medo de cantar sobre medos, ambições, angústias e por aqueles que tem a voz reprimida diversas vezes. Com suas primeiras músicas cantadas em inglês, ele começou a falar sobre superação e liberdade no seu primeiro single “My Rise Your Fall”, lançado no fim de abril.

- Eu já vivi relações em que fui abusado e estar nesta situação é como viver em uma prisão, por isso a música fala de seguir em frente e se libertar para resgatar o próprio valor e reaprender a se amar. Percebo uma identificação muito forte com o tema. Relações abusivas são muito comuns e a música é um grito de liberdade e uma ode ao amor próprio – disse ele na época do lançamento.

E o querer bem e a exaltação continuam a trilhar a carreira dele, exemplo disso é a sua nova música, lançada essa semana, que leva o nome de ‘Phenomenal’, que tem como intuito falar sobre a auto aceitação e amor próprio.

- Espero que minha voz possa chegar as pessoas da forma que eu sempre quis, como alguém que só quer falar de amor e de respeito. Disso a gente pode abusar sem moderação. Não existe excesso de amor e nem excesso de respeito. Se eu puder inspirar, comunicar, confortar ou alegrar alguém através do meu trabalho, me considerarei um artista feliz e de sucesso – completa Raza.

Destaque na TV com o personagem Catatau, na trama das 19h da Globo ‘Salve-se Quem Puder’, Bernardo de Assis viu nessa mais uma oportunidade de ter voz e falar sobre a transexualidade. Assim como Bernardo, que é um homem trans, o seu personagem na trama também é.

- Estar em uma novela em rede nacional faz com que corpos trans sejam vistos e naturalizados na televisão. Isso é uma abertura de portas e uma desconstrução de pré-conceitos – diz.

O carioca, de 26 anos, tem nas artes a voz que precisava, pois foi através dela que ele deu um passo importante e identificou sua transexualidade, durante o processo criativo do espetáculo BIRD.

- A diretora e dramaturga Livs Ataíde me convidou para participar do espetáculo que seria sua formatura na UFRJ. À princípio, ela montaria "Agreste", mas decidiu criar a própria dramaturgia a partir de experiências pessoais e exercícios feitos em sala de ensaio. Desde o início, a única coisa que sabíamos sobre BIRD era que teria uma personagem chamada Maria Elisa: uma menina de 14 anos que em um belo dia acordava de barba. Conforme Livs ia escrevendo as cenas e nos apresentando, eu sentia alguns incômodos e comecei a olhar mais para mim. Percebi que tinha muita coisa em comum com Maria Elisa e, à medida que a personagem ia crescendo, eu ia crescendo junto e me fortalecendo enquanto homem. Na estreia, eu já era Bernardo – explica o ator.

Bernardo tem usado o seu espaço para debater assuntos importantes, mas também para produzir sobre. Além da novela o ator tem outros projetos, como o seu primeiro curta, ‘Bhoreal’.

- Em 2020 dirigi meu primeiro curta, "Bhoreal", que teve sua estreia em um festival com a Mídia Ninja, passando pelo Festival de Cinema de Vitória e pelo Festival For Rainbow. É um documentário sobre a Drag Queen Gervásia Bhoreal, que durante a pandemia fez alguns projetos sociais com moradores de rua de São Paulo. Esse curta nasceu como um exercício do curso Audiotransvisual: uma iniciativa do cineasta André da Costa Pinto, que ofereceu uma formação online e gratuita a 30 alunos trans durante o período de isolamento social – completa.

Além de ‘Bhoreal’, Bernardo tem mais um documentário ficcional chamado ‘Filho Homem’, onde aborda as diferenças e as proximidades entre dois irmãos – um criado para ser homem e outro para ser mulher.


Continuando a falar em força e resistência, agora na música, as dragqueens cantoras, Sara e Nina são outro exemplo. A dupla, formada em 2014, fez sucesso no show ‘Minhas Mulheres Tristes’, onde faziam homenagem às músicas cantadas por mulheres das décadas de 40 a 70 da música brasileira, principalmente do gênero samba-canção (conhecido como fossa). Receberam Moção de Louvor e Congratulações concedida pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro pela importância e representatividade de seu trabalho. Fizeram uma fala no TEDx, em Belo Horizonte, 2018, com o título “Que ser somos nós?”, sobre a pluralidade na expressão humana.

Em julho elas preparam para lançar o primeiro álbum musical, chamado ‘Céu de Framboesa’, nome, aliás, do primeiro single oficial delas lançado no mês de junho.

A vontade de iniciar um trabalho autoral veio da necessidade em expressar artisticamente as vivências de Sara e Nina ao longo dos anos juntas, desde 2016, tanto nos palcos como nas ruas e em encontros e relações com outras pessoas da mesma comunidade, a população LGBTQIAP+.

- Nossas dores e lutas são nossa história diária, assim como nossas conquistas. Vivemos mais na luta que no regozijo e o nosso trabalho é justamente sobre a possibilidade de transformação desse quadro - diz Sara.

O que todos esses artistas têm em comum é a luta frente as adversidades, seja do mercado e também do preconceito, sofrido de forma escancarada ou velada, mas eles seguem e mantém na música o canto forte e na comunidade a base para seguir em frente.

- Além de contar e cantarmos histórias de dor de tantas e tantos de nós, estamos também fazendo uma ode ao direito de ser quem se é - finaliza Nina.